Fonte: Diário de Pernambuco
Via: Agência O Globo
Libelo contra o jugo imperialista sobre os estados latino-americanos, O Eternauta, clássico dos clássicos das histórias em quadrinhos argentinas, capaz de rivalizar com Mafalda,
de Quino, enfim ganha uma edição no Brasil, 55 anos após seu
lançamento. Recém-chegada às livrarias, a edição brasileira, publicada
pela Martin Fontes Editora, traz um prefácio que relembra a tragédia em
torno de seu criador, o roteirista Héctor Germán Oesterheld. Nascido
em 1919, ele desapareceu em abril de 1977, em meio a uma reunião de
militantes de esquerda, como reação da ditadura aos antipatizantes do
regime militar na Argentina. Suas quatro filhas caíram na
clandestinidade e acabaram assassinadas. Duas delas estavam grávidas
quando foram mortas.
"Na leitura de Oesterheld, O Eternauta tinha
um herói coletivo. Lendo a HQ com a necessária distância histórica,
pode-se dizer que essa coletividade poderia ser uma representação do
próprio povo argentino, em luta com suas dificuldades
sócio-históricas", explica Paulo Ramos, autor do livro Bienvenido — Um passeio pelos quadrinhos argentinos.
Com desenhos de Francisco Solano López (1928-2011), O Eternauta é uma ficção científica que foi publicada em capítulos, de setembro de 1957 a setembro de 1959, na revista em quadrinhos Hora Cero Suplemento Semanal,
publicada pela Ediciones Frontera, empresa fundada por Oesterheld e
seu irmão, Jorge Mora. A trama é centrada na conversa entre um
roteirista de HQs (alter ego do próprio Oesterheld) e um viajante do
espaço que se materializa em sua casa numa noite.
Apresentando-se como O Eternauta, o sujeito
misterioso, chamado Juan Salvo, relembra seu passado, no qual, vestido
com trajes de borracha e máscara de mergulhador, ele enfrenta uma neve
radioativa que cai sobre Buenos Aires, provocando morte em massa. Aos
poucos, Oesterheld transforma o relato de Salvo numa releitura
futurista de Robinson Crusoé, de Daniel Dafoe (1660–1731).
"Influenciado por artistas espanhóis e italianos, os
quadrinhos argentinos sempre tiveram uma força visual grande.
Visualmente, O Eternauta faz jus a essa tradição, com o
acréscimo de ter uma história muito bem escrita", explica o pesquisador
Álvaro de Moya, autor de História das histórias em quadrinhos.
Em 1999, os bastidores mais sangrentos da trajetória de O Eternauta foram relembrados pelo documentário H.G.O.,
no qual os cineastas Víctor Baylo e Daniel Stefanello, entrevistam
colegas de Oesterheld nos quadrinhos, além de escritores como Mempo
Giardinelli.
"Nos anos 1980, no Brasil, a mulher de Solano López quis vender os direitos de O Eternauta
para a editora Vecchi, hoje extinta, mas não quis deixar um exemplar
do quadrinho lá, com medo de que fosse pirateado", lembra o cartunista
Ota.
Metáfora dá lugar ao explícito
Segundo Paulo Ramos, no fim dos anos 1960,
Oesterheld foi deixando o simbolismo de lado para escancarar em seus
roteiros suas reflexões políticas.
"Em alguns de seus últimos trabalhos, ele abandonou a
metáfora e tornou explícita a forma de dominação dos países
desenvolvidos na América Latina", lembra, o pesquisador. "Numa
releitura que fez de O Eternauta, desenhada por Alberto
Breccia e publicada no fim dos anos 1960, os países desenvolvidos se
salvaram do ataque dos extraterrestres após aceitarem repassar para os
invasores as nações latino-americanas.
55 anos para uma HQ super popular em um país vizinho chegar ao nosso?! Poxa, isso ai já é desleixo do pessoal daqui. =/ Mas tirando esse deslize de décadas, enfim temos este tesouro aqui!
ResponderExcluirP.S: É lamentável o destino do autor.