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70% das salas de cinema do país estão nos Estados do Sudeste e do Sul.

Fonte: Agência Brasil. Por Gilberto Costa 

O poeta irlandês Oscar Wilde escreveu que "a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida". A célebre frase não deve valer para o cinema brasileiro. Por aqui, a fruição da sétima arte é que imita a vida. A distribuição de salas de cinemas no Brasil e o acesso da população reproduzem a concentração socioeconômica e a desigualdade regional do país, conforme dados da Agência Nacional de Cinema (Ancine).

De cada dez salas de cinema no Brasil, sete estão em cinco estados do Sudeste e do Sul (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná). Mais da metade está nos estados do Rio e de São Paulo. Seis de cada dez salas estão localizadas em 38 municípios com mais de 500 mil habitantes, que respondem por apenas 0,68% dos 5.565 municípios brasileiros. A concentração de salas de cinema é maior do que a da população: há 101,1 milhões de pessoas nessas cidades, equivalente a 53% dos mais de 190 milhões de habitantes contados pelo Censo Populacional 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2011, menos de 2% dos ingressos vendidos foram nas bilheterias de municípios com menos de 100 mil habitantes. Dentro das cidades com cinema, também há concentração espacial das salas: 85% do “parque exibidor” estão instalados em shoppings ou centros comerciais. Duas grandes redes de salas de cinema (Cinemark e Severiano Ribeiro) concentram 44,5% dos ingressos vendidos aos sábados (o dia da semana de maior público).

O diretor-presidente da Ancine, Manoel Rangel, reconhece a concentração, mas pondera: “É preciso pensar na realidade do que são os municípios.” Segundo ele, cerca de 4 mil municípios têm menos de 20 mil habitantes. Com o mercado pequeno e a baixa renda per capita, as pequenas cidades “não têm viabilidade para manter salas de cinema em modelo comercial”. “Cabe ao Estado regular e induzir. Mas não basta a vontade, tem que partir das condições objetivas”, ressaltou ao lembrar que a instalação de cinemas é uma “decisão de agentes privados.”

Para Júlia Moraes, assistente de direção e produtora dos filmes Amarelo Manga (2003), Baixio das Bestas (2006) eFebre do Rato (2011), “o cinema no Brasil é de elite, quase um luxo” e esbarra no “problema grave de cultura e educação”. Na opinião da produtora, o problema social se agrava com a má circulação das cópias das películas para exibição dos filmes. “Há um gargalo na distribuição. O resultado é que o filme nunca chega ao público dele”, observa.

Para José Roberto Sadek, secretário adjunto de Cultura da cidade de São Paulo e professor de roteiro da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), a “distribuição de filmes é cara”, o que onera o envio de películas para diversos lugares. Ele espera que o cinema digital barateie a distribuição. “O digital vai causar impacto no custo da película,” avalia.

Além da exibição de filmes no Brasil estar concentrada regionalmente, Sadek lembra que é da natureza do cinema a concentração das produções em alguns locais. Isso ocorre porque “a mão de obra é cara, assim como o equipamento e a finalização”, Segundo ele, São Paulo e Rio “estão perto dos estúdios e das emissoras de TV.”

 “O dinheiro está aqui, assim como a maioria das produtoras e a maioria dos profissionais”, complementa o brasiliense Luiz Roberto Menegaz, diretor de cinema independente e que vive em São Paulo. “Se não mora no Rio ou em São Paulo, é muito difícil ser levado a sério”, lamenta, ao recomendar que “mesmo sendo uma produção amazônica é melhor vir para o Sudeste.”

“É natural que haja dois polos. É assim nos Estados Unidos, com Los Angeles e Nova York”, pondera o produtor e roteirista, Marcus Ligocki. Para ele, “o mercado leva a essas concentrações para otimizar recursos, acesso ao financiamento e facilidade para encontrar profissionais.” A mesma dinâmica de concentração ocorre, por exemplo, na Espanha (Madri e Barcelona), na França (Paris) e na Argentina (Buenos Aires).
Franz says: uma triste realidade que mostra o descaso com que as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste ainda são tratadas. Apesar de já haver uma certa evolução no trato e consideração com essas áreas, muito ainda resta a fazer. É inadimissível ver o equivalente a quase 3/4 do país ser posto em segundo plan. As riquezas culturais, os talentos e o povo dessas regiões merecem o mesmo tratamento dado aos moradores das áreas mais populosas e influentes do país.
A cultura é um bem que deve ser distribuído de forma igual, coerente e sem distinção. Aguardar meses pela chegada de um filme, peça teatral ou uma revista é, no mínimo, contraditório para um país que prega o desenvolvimento e a valorização da cultura nacional. Está na hora de voltarmos a atenção para quem precisa e merece esse respeito. Chega de olhá-los apenas quando ocorrer uma tragédia ou algo similar.
P.S.: lembrei que o Jurandir Filho (cinema com rapadura) ou alguém de lá, não me lembro ao certo, disse que teria que ir a São Paulo para assistir o filme do Batman do jeito que ele queria (em Imax ou algo assim), pois no Estado dele não havia tal conforto e tecnologia. Será que ninguém vê que esses lugares tem um grande potencial de mercado e está lotado de consumidores e apreciadores de cultura e entretenimento?

Comentários

  1. A cultura foi elitizada, esse é o problema. Tão elitizada que, além do problema apontado na matéria, hoje os cinemas estão praticamente confinados aos shoppings, situados não como exibição de arte ou mesmo de entretenimento, mas como objeto e chamariz para o consumo.

    E pensar que, nos primórdios do cinema, surgiram os nickelodeons (http://en.wikipedia.org/wiki/Nickelodeon_(movie_theater)). Para compensar, se isso for uma compensação, hoje as pessoas podem ver filmes em casa, com uma simples TV ou com um sofisticado Home Theater. Porém, isso não justifica.

    Além da concentração regional e da concentração local, temos outro problema sério: o de exibição de filmes do "circuito alternativo", ou seja, o cinema não feito por grandes produtoras/distribuidoras, o cinema de arte, não-comercial. Ficaram restritos aos cineclubes, centros culturais, mostras de cinema internacional. Esses dificilmente passam na TV, em canais abertos ou pagos. Como fazer para assisti-los?

    Um problema decorrente dessa falta de consideração com grande parte da população "consumidora" de cultura é um efeito colateral: a pirataria. Verdade que muitos podem recorrer a ela podendo ter acesso, mas e os que não tem acesso? Não por culpa própria ou falta de recursos, mas por culpa dessa grande concentração que exclui boa parte do público apreciador de cinema.

    A lembrar que muitos não querem luxo: querem apenas assistir ao filme. Em outros tempos um projetor, o filme, um punhado de cadeiras e um local para projeção bastava. Não há desculpa para o filme não ser exibido, mesmo com algum atraso.

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