Fonte: Veja.
Texto: Fernando Amorim
Texto: Fernando Amorim
Dia desses conversei com o Mike, um inglês boa praça casado com uma brasileira, dono de uma lan house perto da minha casa. A conversa descambou para política, pobreza e corrupção no Brasil.
No meio do papo, com a verve da lógica saxônica, o Mike perguntou: o
Brasil tem muitos pobres, mas alguém perguntou o motivo da pobreza?
Espantosa e simples indagação. Concluímos que a pobreza é prima da
ignorância, filha da corrupção, neta da omissão, irmã do populismo e
bastarda da ausência de oportunidades.
Saí de lá com esse pensamento. Diante dos atuais, e porque não dizer
históricos, problemas salariais dos militares brasileiros, cabe também a
lógica pergunta do Mike: porque as Forças Armadas ganham mal ?
As explicações são várias: estrutura verticalizada da autoridade, com
as decisões centradas no que manda mais, ou seja o Comandante. Quem
manda é o Comandante. Por isso, quem está logo abaixo quer o cargo dele.
É a fila que anda sem marolas, e assim vai até a base.
Daí o círculo vicioso dos emarolados que não querem se queimar ou se
indispor, de olho numa merreca a mais, como insinuou o Lula.
Militares são “migalheiros”, o Lula acertou.
Outra explicação, consequência da primeira, é a acomodação com a
miséria. Estamos precariamente aparelhados, equipados e nos acostumamos a
cumprir a missão dessa forma. Nossos hotéis de trânsito são ruins e
nossas moradias são acanhadas porque incorporamos esse modo acochambrado
de viver, afinal somos militares e militar não pode ter conforto.
Daí nos contentarmos com migalhas salariais, como disse o Lula.
Sempre foi assim. É o conformismo da merreca, pior do que não vir
nada…., já dizia o meu avô.
Uma terceira explicação é a conveniência da disciplina. A disciplina é
usada para justificar a mudez conveniente. Não podemos dizer isso ou
tomar tal atitude porque somos disciplinados, o regulamento não permite,
temos de acreditar nos chefes, não posso me manifestar porque o
estatuto impede, então só resta mandar a mulher protestar batendo
panela, isso é ridículo.
Alguém já viu mulher de juiz, político, diplomata, auditor da receita
ou procurador batendo panela no meio da rua? Marola, quando justa não
faz mal a ninguém, pelo contrário, alerta sobre um estado de coisas. O
que é mais feio: esposa batendo panela ou a penúria com disciplina?
As carreiras citadas acima são carreiras de Estado, mas os militares
pagam mais pelas mazelas do Estado. Uma quarta e última explicação é a
mania de se desvalorizar. Militar não se dá valor, os cursos são
difíceis, as exigências profissionais são absurdas, mas o militar
despreza esse fato. Quando faz um curso, tira do contracheque a
habilitação anterior.
Não incorpora gratificações, não ganha hora extra e fica disponível
ao empregador em regime integral, sem receber por isso, ao contrário, os
chefes antigos até aquiesceram quando a MP 2215 subtraiu a gratificação
por tempo de serviço e o posto acima na reserva. Só que quem negociou e
assinou embaixo não perdeu nada.
A culpa não é do Chefe “A” ou do Comandante “B”. A culpa é do
patriotismo errante, da postura filha do carreirismo, irmã da
autoflagelação merrequeira , neta do comodismo da marola, prima do
complexo de inferioridade e bastarda da conveniência verticalizada.
Um dos sinais da desagregação de uma nação é quando as Forças Armadas
dão sinais de fragilidade. Na queda do Império Romano foi assim. Mas
isso eu não falei pro Mike.
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