Pular para o conteúdo principal

Anabela. Conto de Filipe Gomes Sena.


Por: Filipe Gomes Sena. Curta nossa fanpage: Apogeu do Abismo.

“Nunca escreva quando estiver cansada, nem quando estiver doente e principalmente: nunca escreva enquanto o relógio estiver marcando três da manhã”.
Foram as palavras ditas pelo avô de Anabela quando ela disse, ainda criança, que queria virar escritora. O avô dela era escritor, assim como o avô dele e assim como a paixão pela escrita sempre pulava uma geração, aquele aviso era dito pelos avós para seus netos.
A voz do avô de Anabela foi o último bastião de ordem no caos dos sonhos febris. A moça tinha passado as últimas quatro noites delirando de febre. Ela tinha passado as últimas quatro noites ouvindo os avisos do avô e nos últimos quatro dias ela tinha acordado sentada na escrivaninha, poucos segundos antes de encostar a caneta no papel… Com o relógio marcando três e meia da manhã.
Anabela estava esgotada. Os dias de febre tinham consumido todas as suas energias e o sono não apareceria enquanto o Sol ainda estivesse no céu. A pouca fome dos últimos dias tinha desaparecido naquele domingo. Seja qual fosse a batalha que estava sendo travada ali, não era Anabela que estava ganhando.
“Quando estamos cansados não conseguimos perceber o mal que nos ronda”.
O relógio marcava dez da noite quando o sono chegou. Ela engoliu dois comprimidos antes de deitar. O sono sempre chegava antes da febre e os comprimidos conseguiam ao menos deixar a temperatura controlada.
“Quando estamos doentes temos seres estranhos no nosso corpo, alguns deles gostam de nos fazer escrever o que eles não podem falar”.
Algo estava diferente naquela noite. Anabela nunca estivera tão lúcida durante os sonhos que a febre trazia. Várias cores dançavam na frente dos seus olhos, as estrelas dançavam no céu caleidoscópico e o vento cantava no vazio que a cercava. De tanto tremer, por causa do vento ou da febre, caiu de joelhos e encarou a explosão de cores que a cercava.
“Quando o relógio marca três horas e o Sol não está no céu, as passagens para outros mundos são abertas, dentro e fora da gente”.
O vento deitou Anabela no chão. As cores mergulharam por baixo dela para fazer uma cama, as paredes e a escrivaninha. Uma versão multi cromática do seu próprio quarto. O braço direito se debatia compulsivamente como se procurasse algo, as pernas escorregaram para fora da cama e com um impulso colocaram Anabela de pé. Passos trôpegos levaram a pobre moça para a mesa, a mão direita finalmente encontrou pela pena que procurava. A cama se jogou em forma de cadeira para sustentar a moça enquanto a pena dançava sobre o papel e os avisos do avô ecoavam pelo vazio.
Uma eternidade depois as cores se apagaram. a cadeira largou Anabela no chão gelado, o vento rasgou-lhe a pele e a dor encerrou a alucinação.

Quando acordou, Anabela estava no chão do quarto. A febre tinha passado e a sensação de esgotamento era menor. A cadeira tombada serviu de apoio para que ela se levantasse. Na mesa estava um caderno com meia página escrita e um despertador que marcava dez minutos depois das três e meia da manhã. Ainda desorientada, a moça rasgou o parágrafo escrito do caderno e leu. A língua era desconhecida, mas ela conseguia compreender as palavras malditas que ali estavam escritas. Palavras tão hediondas que as últimas forças da jovem foram exauridas. Por horas ela esteve desmaiada. Quando acordou o Sol já iluminava a janela do quarto, mas o pedaço de papel rasgado do caderno não estava mais lá.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Bethany Townsend, ex-modelo, expõe bolsa de colostomia de forma corajosa.

Bethany Townsend é uma ex-modelo inglesa que deseja, através de sua atitude, incentivar outras pessoas que sofrem do mesmo problema a não ter receio de se expor. Portadora de um problema que a atinge desde os três anos, Bethany faz uso das bolsas de colostomia  que são uma espécie de receptáculo externo conectado ao aparelho digestivo para recolher os dejetos corporais, e desejou mostrar publicamente sua condição.  Quero que outras pessoas não tenham vergonha de sua condição e é para isso que me expus , afirmou a ex-modelo. Bethany usa as bolsas desde 2010 e não há previsão para a remoção das mesmas.  Eu, pessoalmente, concordo com a atitude e respeito-a pela coragem e o exemplo que está dando. Não há outra opção para ela e isso irá forçá-la a viver escondida? Jamais... Veja o vídeo com o depoimento dela. Via BBC

Ron Mueck - Escultor realista

Curta nossa fanpage:  Apogeu do Abismo Um artista que tem um talento inacreditável, o escultor Ron Mueck, nascido na Austrália, transporta as ansiedades, os medos e toda uma gama de sentimentos que englobam o ato de viver, expressando-os através de seus trabalhos realistas e, por vezes, chocantes. Saiba um pouco mais deste escultor cultuado em todo o mundo: Algumas fotos para ilustrar melhor o realismo do autor. Reparem nas dimensões das estátuas expostas e percebam o grau de detalhamento que Ron atribui às suas esculturas, sejam gigantescas ou pequenas.

Escritora brasileira lança campanha contra pirataria com pintura corporal. Via G1

Fonte: G1 A escritora brasileira Vanessa de Oliveira fará um novo protesto contra a pirataria de livros. Desta vez, mostrará seus atributos físicos em território nacional, a começar por fotos para ilustrar a campanha por ela idealizada. A autora ganhou fama após aparecer nua em frente ao palácio do governo do Peru, em Lima, em julho. Ela descobriu que uma de suas seis obras – “O diário de Marise - A vida real de uma garota de programa” – era vendida em barraquinhas clandestinas nas ruas da cidade. O novo topless está programado para domingo (12), na livraria Martins Fontes da Avenida Paulista, na Zona Sul de São Paulo, às 15h30. O evento faz parte da nova agenda da escritora. A ex-garota de programa, de 37 anos, encabeçou uma campanha contra a cópia e venda ilegal de livros e pretende usar seu corpo para fazer piquetes internacionais. O protesto em um ambiente privado foi sugestão de Vanessa à editora Martins Fontes, que comercializa seus livros. De volta a