A história é conhecida por muitos que já assistiram filmes de zumbis,
principalmente Guerra Mundial Z. Por que? Simplesmente porque os infectados são
muito parecidos com os de Guerra Mundial. Eles são rápidos, violentos e
irrefreáveis. O processo de contaminação é quase instantâneo, o que dificulta o
combate aos atingidos pela praga. Contudo, as similaridades param por aí.
Texto: Franz Lima.
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E qual seria o diferencial nessa produção. Trem para Busan (no Brasil usaram o péssimo título Invasão Zumbi) é um filme
oriental, ambientado na Coréia do Sul. Os orientais são conhecidos por suas histórias mais realistas,
desprovidas de apego ou sentimentalismo. Mulheres, crianças, idosos... ninguém
está a salvo de uma morte violenta diante de uma ameaça dessa magnitude. Não dá
tempo para se identificar com a maioria das personagens, já que a morte
alcança-os bem antes disso.
A história base.
Logo de cara somos postos diante de um homem de negócios. Vida estável
financeiramente, porém caótica quando o assunto é família. Divorciado, Seok Woo está
com sua filha, Soo-an, uma menina que sente a falta da mãe. Muito dessa saudade
se dá ao fato de seu pai ser um homem voltado aos negócios, distante e relapso.
Apesar de tentar agradar, sua ausência, mesmo quando presente, é notável por parte dos
espectadores.
Diante de um erro logo na véspera do aniversário da filha, ele se vê
convencido a levá-la até a mãe na cidade de Busan. A viagem tem tudo para ser
tranquila. O trem é moderno e o tempo até chegar lá não parece ser longo.
Entretanto, a tragédia já está anunciada. Pessoas contaminadas estão
nos vagões. É o estopim para o caos.
Não há nada que se possa fazer para evitar a propagação da morte.
Milhares de pessoas são infectadas e perdem toda a noção de certo e errado,
tornando-se verdadeiros assassinos. Seus instintos primitivos são despertos com
brutalidade e suas ações estão à altura de animais selvagens.
O governo tenta passar a sensação de tranquilidade. Alega ter controle
sobre os acontecimentos, mas as cenas mostradas durante esses discursos
comprovam que os políticos apelam para a mentira em todas as ocasiões.
Diante de uma situação de crise, logo se forma um grupo de pessoas com
o mais óbvio objetivo: sobreviver. Cada um tem sua motivação...
Há o pai e a filha em uma jornada de redescoberta. Há um homem que
acompanha sua esposa grávida. Uma dupla de irmãs idosas que se amam muito.
Também existe um grupo de estudantes cheios de vida. Por fim, um mendigo fecha
o grupo que mantém o núcleo de sobreviventes. Cada um com sua motivação para
seguir em frente, porém todos extremamente dependentes da coesão desse
improvável grupo.
Permeando essas pessoas, encontramos indivíduos covardes e fracos.
Homens e mulheres que ainda pensam estar em suas posições sociais de poder. A
manipulação do medo por eles é um dos pontos altos da trama, pois mostra o quão
danoso o ser humano pode ser. Mais letal do que os zumbis é a crueldade humana,
o senso de sobrevivência que ultrapassa todos os limites morais. Trem para
Busan irá lhes apresentar algumas pessoas cujas índoles são a essência do mal.
Nota: nomes e etnia são detalhes pouco importantes nessa produção. O
que aconteceu – incluindo as reações das pessoas – é algo típico do
comportamento humano. Falhas e heroísmos mostrados teriam coerência em qualquer
lugar do planeta.
Crime e castigo.
Nada passa incólume nessa produção. Todo mal terá seu pagamento, assim
como as boas ações terão seu quinhão. A verdade é que a lei da ação e reação
funciona bem demais em Trem para Busan.
Mas o que define as motivações dessas ações? Homens e mulheres lutam
para rever as pessoas que amam. Nessas lutas é possível ver que os limites são
postos de lado quando os interesses surgem. A força prevalece sobre o amor. A
violência toma o lugar do bom senso.
A justificativa para esse contágio brutal que quase exterminou um país
é mostrado... e isso não muda em nada a relevância do filme. O que conta, ao
final das contas, é o sacrifício em prol de quem se ama, as perdas para que
outros ganhem. Morrer, em algumas cenas, é um ato de amor e libertação.
As similaridades com Guerra Mundial Z, como já dito, existem e isso
não incomoda. A abordagem de zumbis/infectados ágeis e vorazes já foi vista,
porém Trem para Busan mostra mais dos problemas comportamentais do homem do que
os malefícios dessa praga. O que está em julgamento são os limites da
arrogância e da crueldade das pessoas diante do fim. Até onde é possível ir
para se ver livre de um mal?
Vocês assistirão ao filme e irão julgar... mas é preciso refletir se não
tomaríamos algumas das atitudes desprezíveis e questionáveis caso fossemos nós
na mesma situação.
Há grandes cenas que ficarão na memória de quem se aventurou nesse
filme. Efeitos especiais muito bem feitos e locações claustrofóbicas. Algumas
das mortes estão envoltas em emoções que impactam o espectador. Mas é no final
que encontrei duas cenas inesquecíveis: uma envolvendo perda e sacrifício;
outra na qual uma canção mostra com clareza que nunca é tarde para recomeçar.
Nota final.
Gostei demais e recomendo muito que assistam. Tensão, dor, perdas e
muitas amostras do potencial destrutivo do homem estão nessa obra, assim como
também estão a compaixão, o sacrifício e a redenção.
Filme digno do tema, sem exageros, com ótimas interpretações e que definitivamente está no hall dos
que precisam ser vistos e respeitados. Esse respeito se deve não só à ótima abordagem dos temas de zumbis, mas também por incluir drama e uma imersão profunda nos malefícios de uma epidemia somada à péssima índole dos homens diante do caos total.
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