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O mercado de quadrinhos no Brasil é só para os mais abastados?

Olá, meus amigos. Eu sou Franz Lima e este post é mais uma forma encontrada para alertar o consumidor dos quadrinhos nacionais de qualidade superior, os chamados "gourmet". Na verdade, os quadrinhos não são os únicos afetados por essa jogada de mestre dos empresários do ramo, uma vez que livros, DVD, Blu-ray, cadernos, camisetas, dioramas e action figures também estão nesse conjunto voltado aos indivíduos de maior poder aquisitivo. 

Mas, vamos refletir, como chegamos ao exorbitante preço de 250 reais em uma edição como Conan, o Bárbaro - A Era Marvel 1? E será que o preço praticado é realmente justo? Não vou abordar a já polêmica Omnibus do Quarteto Fantástico...

Custos x Renda

O custo de uma obra no país não é algo barato, sobretudo se ela tiver qualidade. Ter em mãos um livro com capa dura, papel de alta gramatura, fitilho, ilustrado, notas do autor, introdução de alguma personalidade e sejam lá quais forem as demais melhorias não é algo tão simples quanto o mero mortal pode pensar. Todos os acréscimos (quando comparados com edições simples) requerem investimentos e planejamentos. O mesmo se aplica quando o assunto é HQ. Os encadernados e as coleções são caros e exigem o mesmo acabamento que livros de luxo, algo comumente visto em editoras de quadrinhos como Devir, Pipoca & Nanquim, Darkside, Mythos e Panini.

Mas, pensemos, será que há prejuízo para essas gigantescas empresas? Antes que respondam, pensem no seguinte: todas as editoras citadas lançam seus produtos na famosa pré-venda, sempre com descontos entre 10% e 30% do produto. Essas promoções geram vendas de centenas de edições (algumas vezes milhares, fato comprovado com a caríssima Conan Omnibus). Não há perdas para as editoras. Há, por certo, ganhos menores. Prejuízo é algo impensável para as donas das maiores fatias do mercado editorial. Do contrário, elas não arriscariam publicar. Temos que compreender que as editoras não são nossas amigas, apenas são comerciantes e, por isso, querem lucro, o que não é algo errado, mas demonstra um certo descaso por aqueles que não possuem os recursos para obter os objetos de desejo.

Sei que alguns leitores dirão que colecionismo é para os que podem, isto é, esse é um mercado seleto. Até concordaria se todas as publicações fossem voltadas a tal público, mas o fato é que editoras, produtores de brinquedos e demais empresas que lucram com o mercado geek/nerd têm a maior parte de seus lucros com os produtos menos caros. Há várias edições de quadrinhos publicadas por 10 reais e que oscilam até um valor aproximado de 25 reais. Essas edições são o ponto alto de lucro da Panini. Já a Mythos possui também edições com preços que variam de 13 reais a 35 reais, além de suas já famosas edições mais luxuosas de Hellboy, Conan e Juiz Dredd.

Quanto à Darkside e Pipoca & Nanquim, observo que seus preços não são tão ruins, porém poderiam se manter mais baixos, fato comprovado pelas incontáveis promoções na Amazon (e outros sites) e até mesmo no site das próprias editoras. A Mythos até busca atrair um público maior com promoções em grande quantidade no seu site, contudo esses descontos são mais presentes e efetivos em produtos menos caros. Basta dizer que algumas de suas graphic novels têm o preço acima de 100 reais facilmente. Claro que nada superava - até Conan Omnibus - o preço exorbitante de A Liga Extraordinária 1898, da Devir, outra editora que não alivia nos preços de suas obras.


E o que dizer da Rocco que lançou uma edição comemorativa de 20 anos de Harry Potter, a coleção, que chegou com o precinho camarada de 450 reais! Notem que a essência da obra é a mesma, apenas modificou-se a estrutura externa, acrescentou-se um "box" e ilustrações (ainda que já houvesse outros boxes especiais - e caros - além da série ilustrada por Jim Kay que tem o sugestivo preço médio de 120 reais por livro). O relançamento de aniversário da série Jogos Vorazes também assustou com seu preço "camarada" de 220 reais, onde os acréscimos são: capa dura, um folhetim com uma entrevista da autora e o box, nada mais. 

E o que isso tudo realmente significa? A grande indústria do entretenimento impresso, isto é, revistas, quadrinhos, livros e outras mídias similares, sabe que existe um público com poder aquisitivo suficiente para que obras de grande valor de compra sejam comercializados de forma que o prejuízo seja algo quase impossível. Sabem, ainda, que até mesmo os menos privilegiados financeiramente farão, em um espaço de tempo relativamente curto, um esforço hercúleo para adquirir a edição de luxo. 

Todas as empresas querem lucrar muito, isso é um fato inquestionável que está presente também nas mídias digitais como DVD, Blu-Ray e outros, seja através das "edições especiais" ou por meio dos caríssimos Steelbooks. E que fique claro que lucrar é imprescindível para a continuidade de qualquer empresa. O que questiono é o lucro exacerbado que se vale do saudosismo de muitos por meio de edições especiais, relançamentos e outras mil "armadilhas" que custam muito mais do que deveriam. A prova? Como já dito no início deste texto, as empresas mantêm promoções antes, durante e após o lançamento da obra sem que isso resulte em prejuízo. 

A cobiça das empresas é tão grande que vimos, há poucos dias, o relançamento da linha de brinquedos da série He-Man e os Mestres do Universo (dos anos 80) que se esgotou em pouquíssimos dias (comprados por exploradores com muito dinheiro que colocam em sites de venda os mesmos produtos por preços altíssimos). A empresa repôs o estoque e povoou novamente as lojas com seus produtos, porém desta vez com preço 30% maior). Qual o nome disso? Cobiça. Exploração.

Que fim claro: nenhuma empresa precisa ter "cotas" ou produtos cujos preços estejam de acordo com classes menos favorecidas. Um produto é feito para determinado grupo, conforme o poder aquisitivo... e pronto! Mas ao vermos que os preços podem ser (e são, ainda que temporariamente) menores, isso deixa claro que os altos valores cobrados são, indubitavelmente, vontade de empresários que não buscam agradar e cativar um público, apenas enriquecer cada vez mais.

Só para ricos?

Não, o mercado editorial brasileiro (assim como os fonográficos, de filmes e outros produtos) não são exclusivos dos ricos. Claro que há produtos acessíveis apenas aos privilegiados - tal e qual outras sociedades e países pelo mundo - como os carros de luxo, apartamentos à beira-mar e uma grande gama de produtos. Esse não é o problema. Quando, especificamente, falamos de quadrinhos de luxo no Brasil, via de regra falamos sobre "relançamentos" em formatos mais nobres. Essas obras já foram publicadas e estão disponíveis em várias edições (como é o caso de Batman, o Cavaleiro das Trevas que foi publicado em formato de minissérie, encadernado em capa cartão, encadernado com capa dura prateada, encadernado com capa dura colorida, além das várias reimpressões), porém sempre serão reeditadas por causa da facilidade com que são vendidas.

Então se as indústrias dos quadrinhos, literária, brinquedos e de filmes em blu-ray/DVD possuem produtos de fácil acesso às classes com menor poder aquisitivo, o que as leva a produzir algumas obras cujo valor está totalmente fora da realidade de uma esmagadora maioria dos consumidores? Essa resposta já foi fornecida ao longo deste post: saudosistas que são capazes de vender um rim para comprar a novidade, consumidores que fazem uma "poupança" para adquirir suas preciosidades, uma minoria que compra por possuir recursos para isso e, claro, uma crescente onda de consumismo provocada por um relativo "aumento de renda" e o bombardeamento midiático acerca da necessidade de comprar.

Outro fator importantíssimo sobre os gastos desnecessários por parte dos que não têm tantos recursos está na "facilidade" de parcelamentos. A tentação em comprar - ainda que sejam obras baratas - leva o consumidor a um endividamento gradual, quase imperceptível. Apesar dessa informação não ser vital para o post em si, cabe destacar que há cada vez mais acumuladores em nosso país, muitos incentivados pelo ininterrupto apelo das propagandas que estão nas TVs, outdoors, redes sociais e em praticamente todos os lugares.

Mas voltemos ao temas principal que é "quadrinhos - e demais mídias - são apenas para os ricos?". A resposta a esse questionamento é bem clara, pois há produtos para todas as classes sociais. O que não está claro - ressalto - é o motivo do lançamento de obras cada vez mais caras que, com o decorrer do tempo, ficam mais baratas ou até mesmo são vendidas por preços irrisórios.

Inflação e impostos são fatores justificadores?

Tenho certeza que o leitor já deve ter se questionado sobre isso. Somos um país com taxas sobre produtos cada vez mais vorazes. A inflação não está sob controle total e, em consequência, tudo fica mais caro, inclusive as matérias-primas usadas em revistas, livros, discos, blu-ray, dvd e toda uma gama de produtos consumidos em larga escala. 

Em função do acima exposto, podemos concluir que as empresas (em especial as editoras) têm prejuízo? A resposta é um sonoro "não". Reafirmo que as editoras de maior destaque no Brasil não são prejudicadas pelos aumentos tributários ou de preços das matérias em nenhuma hipótese pois, como sempre, repassam os valores ao consumidor. Assim, fica claro o motivo de uma editora de pequeno porte como a Pipoca & Nanquim ter se equiparado às outras gigantes do mercado. Entretanto, que fique registrado que - quase sempre - seus produtos são de alta qualidade e possuem uma curadoria diferenciada que atrai um público muito específico que quer mais e mais qualidade, além de obras raras ou jamais publicadas aqui.

Algumas empresas entregam um produto totalmente "novo" ao lançar obras que foram impressas em partes ou não receberam o devido acabamento. A editora Aleph brindou seu público com uma das mais importantes obras de Isaac Asimov, a Trilogia da Fundação, com um acabamento impecável, páginas em papel pólen de alta gramatura, capa dura, ilustrações inéditas e 880 páginas com o melhor da ficção. À época do lançamento, foi possível adquirir por 100 reais pela Amazon, porém o preço não se sustentou e hoje já encontramos o mesmo livro por 125 reais ou mais. 

Por favor, não quero crucificar nenhuma editora por dispor de livros e quadrinhos caros. Meu intuito com este post é frisar que os preços podem diminuir consideravelmente e, mesmo assim, a editora ter um lucro aceitável. Acredito que o lucro com a venda de algumas unidades por um preço alto não compensaria jamais o provável lucro com a venda de mais unidades a um preço mais acessível ao consumidor de menor poder aquisitivo. 

Enfim, esta é um problema que tem muitas variáveis para chegarmos à solução ideal, aquela voltada ao público que merece ter acesso a livros, filmes, action figures, carros e seja lá mais o que for, sem que para isso precisem ficar por meses ou anos lotados de parcelas a pagar ou, ainda, privados de muita coisa em prol de obter aquilo que amam. O lucro é necessário e justo para qualquer empresa que honestamente construiu seu patrimônio, porém é indiscutível que há má-fé por parte de boa parte do empresariado sedento pelo enriquecimento e pela ampliação de literais fortunas. 

Leis de incentivo à cultura e redução de taxas para livros são realidades que não minimizam o preço final para o consumidor. E outra comprovação sobre isso está no fato de que os livros em alta, isto é, aqueles que são lançamentos ou edições especiais têm os preços quase idênticos para a mídia física e digital, o que novamente indica a persistência em não vender com preços justos obras em destaque à época. 


Mesmo com uma carga de impostos (que oscilam de estado para estado) e de matérias-primas também em alta de preços, insisto em dizer que não há interesse das grandes editoras de livros e quadrinhos em diminuir seus ganhos. Elas lançam seus produtos como se fossem os últimos do mundo, o que poderia justificar essa cobrança incompatível com a realidade de mais de 90% da população economicamente ativa do país, isso sem citar os desfavorecidos e aqueles que vivem à beira da miséria, cujos parcos recursos mal dão para comprar um gibi da Turma da Mônica. 

Será que um dia teremos uma reversão nesse quadro que reduz o acesso ao lazer e à cultura, além de incentivar a busca pelos sites de torrents, scans e a compra de produtos de menor qualidade? O lucro de algumas das empresas citadas e de outras cuja política seja similar gera um distanciamento destas das classes de menor poder aquisitivo, incentiva a pirataria (inclusive a digital) e reduz drasticamente a arrecadação no país. Isso se aplica não apenas às citadas empresas e editoras como, ainda, às franquias de camisetas, action figures, pôsteres, cinemas e outras que são "municiadas" por uma grande massa de fãs geeks e nerds.

É hora de repensar estratégias e ver que não vivemos em um país com distribuição de renda justa ao ponto de poder cobrar somas que chegam a 1/3 do salário mínimo. Provavelmente nada mudará, mas ao menos fiz minha parte ao alertar e esclarecer sobre uma realidade que muitos fingem não existir... 




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