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Joelma - 23º andar. A tragédia transposta para o cinema é impressionante.


Pelo simples fato de estarmos no ano de 2023, é grande a probabilidade de você não conhecer os fatos por trás da tragédia do edifício Joelma. Provocada pelo incêndio cuja origem ainda deixa dúvidas, a tragédia no edifício Joelma ocorrida no dia 1º de fevereiro do ano de 1974 é uma das mais lamentáveis do país. 

O Joelma fica localizado no centro urbano da cidade de São Paulo, mais precisamente na avenida 9 de julho, em pleno Vale do Anhangabaú. O prédio se tornou famoso por causa do incêndio de proporções nunca vistas na história da cidade, o que provocou a morte de 187 pessoas e deixou um saldo de 300 feridos. Em suma, um dos mais tristes episódios de São Paulo.

A análise desta obra é importante para mim por dois motivos: o filme marcou minha vida por sua carga dramática e o fato em si foi presenciado por meu pai que estava nas proximidades quando o incêndio já estava fora de controle. Na verdade, algumas das descrições dele sobre o desespero e as ações de algumas das vítimas foram motivo de pesadelos por muito tempo. Entretanto, essa história faz parte da minha história e vê-la em um filme é uma retomada de um período que foi importante para meu crescimento como pessoa.

A trama do filme mostra uma mulher cujos sonhos revelaram que haveria um grande incêndio na cidade de São Paulo, mas este não era ainda o que atingiu o Joelma, e sim o edifício Andraus. Isso, historicamente, está correto. A cidade de São Paulo passou por dois momentos trágicos onde incêndios mataram dezenas de pessoas, sendo o pior o do Joelma. 

A mulher em pauta cujos sonhos indicam essas calamidades é a jovem Lucimar (Beth Goulart, à época com apenas 15 anos), uma sensitiva que previu o incêndio no Andraus no ano de 1972. No longa, ela mostra uma intrínseca ligação com o espiritismo.

* Ao final da crítica, uma entrevista com Beth Goulart feita há alguns poucos anos sobre a participação dela no filme.

Atuações. 

As atuações são bem datadas, fato que não tira qualidade das interpretações. Há algumas passagens onde expressões fixas e um pouco de "overactor" incomodam levemente, talvez por conta da forma narrativa mais acelerada e tecnicamente mais apurada da época atual. Os close-up são usados ao extremo quando há necessidade de incitar no público a sensação de perigo ou ansiedade. 

Há ainda as cenas em que os figurantes literalmente se "encaixam", fato que mostra um pouco da limitação técnica e do planejamento da produção. Mesmo assim, a trama flui de forma aceitável, já que estamos sendo conduzidos para a fatídica manhã do incêndio no edifício.

Entretanto, após iniciar efetivamente a narrativa da tragédia, os espectadores recebem interpretações mais fortes e convincentes.

Efeitos visuais e outros atributos.

Para um filme tão antigo, limitado tecnicamente, os efeitos visuais são bem aceitáveis. Há a inserção de imagens da época que, ainda que disfarçadas por cores únicas, têm um papel importante na narrativa, já que dão uma certa dose de veracidade à história. 

A trilha sonora é boa, mesmo com a inserção de algumas delas totalmente "clichês".

O figurino ajuda a dar a ambientação dos idos anos 70, cujo reforço está no linguajar e lugares típicos da época. Hoje é estranho ver pessoas fumando dentro de um elevador e outros ambientes fechados, algo típico da época.

Mas a continuidade é prejudicada pelos cortes "secos" feitos na finalização do filme. A montagem dá a impressão de termos um filme concluído de forma acelerada, o que prejudicou o ritmo narrativo. 

Cenas reais.

A inclusão de cenas reais, muitas disponíveis atualmente na internet, serve para destacar minimamente os estragos feitos pelo incêndio. Além da paralisação da cidade - que acompanhava os fatos - foram 187 mortos e mais de 300 feridos naquele que se tornou o mais trágico incêndio da História em edificações, hoje atrás apenas do incêndio ocorrido pelo atentado às Torres Gêmeas nos EUA.  

Ainda que retratado de forma acelerada no longa, os relatos mostram que o incêndio iniciado no 12º andar do Joelma se propagou em menos de 15 minutos, o que impossibilitou que as pessoas dos andares superiores fugissem pelas escadas. 

O desespero dos atores que interpretaram as vítimas foi bom, mas o destaque ficou a cargo de Beth Goulart e das outras mulheres que a acompanharam nas cenas do incêndio. O desespero levou - como retratado na obra - muitos a tirar a própria vida por causa do medo e do desespero. 

O filme era necessário?

Esse é um questionamento feito à época, já que o país gostaria de esquecer a tragédia. Cabe relembrar que o país já havia passado por outros grandes incêndios, incluindo o edifício Andraus, também em São Paulo, e o Gran Circus Norte-Americano, no Rio de Janeiro em 1961, cujo número de vítimas fatais chegou a 503. 

O intuito da obra cinematográfica não foi despertar as memórias terríveis do incêndio, mas ressaltar a coragem dos que fizeram parte das equipes de resgate e, sobretudo, trazer alento aos parentes e amigos das vítimas fatais por meio da doutrina espírita (representada por Chico Xavier).

Em suma, o filme é pertinente até os dias atuais, uma vez que traz à memória não apenas o fatídico dia, como também as lições deixadas por ele. Assim, destaco que as políticas sobre combate a incêndio e prevenção foram radicalmente mudadas, equipamentos evoluíram e o próprio Corpo de Bombeiros teve suas ações repensadas por causa dos entraves ocorridos no dia. Basta citar que muitos hidrantes não funcionaram, obrigando o Corpo de Bombeiros a aguardar a chegada de carros-pipa. Não há como homenagear os mortos de uma forma mais pertinente que a constante vigília para evitar que outras vítimas surjam de fatos similares. 

Joelma 23º andar é um filme que traz grandes reflexões e nos obriga a pensar sobre a fragilidade de nossos corpos e o verdadeiro valor da vida e das pessoas que amamos. Gravado menos de cinco anos após o incêndio, o longa entrega uma narrativa de esperança para os que se veem diante das perdas. Mais do que uma obra ficcional, o filme é impactante e serve para manter a memória dos que se foram e daqueles que heroicamente lutaram para salvar o máximo de vidas possível. 

Apesar das já citadas limitações técnicas, o longa-metragem deixa suas mensagens - com base no kardecismo e no incêndio - aos espectadores que desejam assistir a essa obra tendo-a como algo além de um simples filme. 

Quanto aos temores e memórias despertados ao iniciar o filme, posso assegurar que não há nada tão terrível a ponto de impactar muito, ainda que seja baseado em uma tragédia real. Já no que diz respeito às memórias, muito do incômodo da época - provocado pelos relatos - se dissipou, ainda que a lembrança das reportagens e do que meu pai narrou nunca possam ser apagados.  

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